Sexta-feira/ 22/ Novembro, 2024 - 21:27

Professor Vicente, um homem à frente de seu tempo

Nascido em Monte Carmelo, no ano de 1935, filho de Romualdo Rodrigues de Resende e Maria Abadia Resende, Professor Vicente fala com orgulho da família

Entrevista: Eduardo Augusto

Não poderia ser diferente a forma de iniciar o relato de uma história de vida…, pois aqueles que conhecem o Professor Vicente Resende, não se sentirão surpresos quando esse senhor, com seus 84 anos, dotado de uma intelectualidade rara e possuidor de um invejável currículo, cujas profissões sempre foram desempenhadas com dedicação e sucesso, começaria homenageando sua professora dos 4 anos do ensino primário no Grupo Escolar Melo Viana: Dona Maria do Carmo Paranhos. Para ele, a grande responsável por sua formação matemática e pelo incentivo à leitura, inclusive de enciclopédias que a professora lhe emprestava; como exemplo, ele cita “O Tesouro da Juventude”, com 23 volumes e, entre risos, diz: “ era o Google de antigamente!”

Foto: Márcio Júnio – Professor Vicente

Nascido em Monte Carmelo, no ano de 1935, filho de Romualdo Rodrigues de Resende e Maria Abadia Resende, Professor Vicente fala com orgulho da família. Seu pai, um exímio carpinteiro, fundador da Sociedade São Vicente de Paulo, em 1931, fez a doação de um alqueire de terra e ele próprio construiu o casarão e mais três casas para abrigar e dar assistência a pessoas com diversas necessidades, na época cerca de 80 a 90 socorridos moraram lá. A mãe, Dona Abadia, que sempre fora a estrutura familiar e do lar, também ajudava no socorro às pessoas assistidas pela Sociedade São Vicente.

Ele tinha apenas 5 anos de idade quando Sr. Romualdo faleceu, e lhe vem à memória um fato interessante, cerca de dez ou doze socorridos, cegos, inválidos, trôpegos… pediram para carregar o caixão de seu pai. Ele afirma que pode se gabar de ter sido filho de um homem extraordinário e, mesmo não tendo a presença paterna por muito tempo, guarda dele as melhores referências. A família é sua grande conquista.

E ele nos conta sobre a família numerosa a que pertence. Com a primeira esposa, Sr. Romualdo Resende teve 20 filhos, esses já falecidos. Do casamento com Dona Abadia, são dois filhos: ele e Terezinha. Após a morte de Sr. Romualdo, D. Abadia se casou com Sr. Geraldo Neves que deram a ele e a sua irmã, mais três irmãos: Amélia, José e Aparecida. Ao todo , são 25 irmãos e uma quantidade expressiva de sobrinhos: mais de 2000!

Da infância feliz, lembra-se de brincar em enxurradas, da praça do Rosário até a chácara do Hélcio Faleiros… ali, o menino Vicente corria pelos pastos, tirava leite de vacas, subia em árvores, enchia os balaios de frutas para vender, caçava passarinhos com estilingue, pescava , entre várias outras atividades, mas sempre estudioso, colecionava medalhas como destaque escolar.

Lembra também do lugar onde nasceu, o belo casarão e a igreja construídos por seu pai na Praça do Rosário, sente-se saudoso e triste com a demolição da casa, mas entende as circunstâncias.

Recorda-se com carinho do Colégio Nossa Senhora do Amparo, em Monte Carmelo, onde cursou o ginasial, na época da construção do prédio novo. Dali tem ótimas lembranças, em especial, de Irmã Elisa, Madre Clara e dos colegas conterrâneos: os filhos da família Langoni, inclusive.

Completou seus estudos na UFU, em Uberlândia, tendo que se deslocar três vezes por semana para assistir às aulas, naquela época. Voltava à noite para lecionar, primeiramente em Nova Ponte, além de várias escolas : Escola Técnica de Comércio São tomas de Aquino, Colégio Juscelino Kubitscheck, Uniube-campus Monte Carmelo.

Após formar-se em Economia, conseguiu uma bolsa de estudos de três meses na Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro. Ele comenta: “Fui para o Rio de Janeiro para ficar 3 meses e fiquei 30 anos”. Mas ressalta que os primeiros seis meses foram muito difíceis, até que se estabilizasse a situação financeira, pois a proposta salarial demorou para ser aprovada e ser paga, conforme foi combinado.

Professor Vicente Rezende e a esposa Oneida Pereira Rezende

Na época , Vicente Resende já havia se casado em Monte Carmelo e contou com o grande apoio e ajuda da esposa, na construção de uma família harmoniosa e bem estruturada. Tiveram 5 filhos, tendo perdido dois deles de forma trágica, uma dor incomparável.

Durante esses 30 anos no Rio de janeiro, o economista de sucesso trabalhou na Fundação Getúlio Vargas, no IBGE, depois foi diretor financeiro da empresa Postes Cavam por muito tempo, voltou para o IBGE, onde se aposentou e retornou para Monte Carmelo.

Ele conta, orgulhosamente, que no Rio conheceu pessoas extraordinárias, encantadoras, grandes economistas que o influenciaram e com quem teve o privilégio de trocar experiências e cita Mário Henrique Simonsen, a quem chama de gênio vivo. Tudo nele confirmava a genialidade, campeão internacional de xadrez, barítono da Orquestra Sinfônica Nacional, uma capacidade matemática deslumbrante.

Revela também que conheceu Paulo Guedes, atual Ministro da Economia,: “Ele, Paulo Guedes ,estava terminando seu Doutorado na FGV, na mesma época em que eu trabalhei lá. Chegamos a trabalhar juntos , redigindo os textos para a revista anual da Fundação Getúlio Vargas. Seu futuro era previsível, era considerado um gênio, como muitos outros talentos que estudaram na Fundação. Ele tem ideias fantásticas sobre a redução do déficit fiscal. O governo do Brasil é muito caro em todos os níveis, com gastos desnecessários e com a corrupção endêmica, independente de partidos políticos.”

Professor Vicente

Ainda sobre a política, ele acrescenta que poderia citar Fernando Henrique Cardoso como o “menos pior” dentre os mais recentes Presidentes do Brasil. Nessa postura crítica, ele argumenta que FHC acertou com o Plano Real e reestruturou a economia brasileira, cita exemplos e explicações de como era a inflação naquela época, mas o governante também cometeu erros, principalmente no que se refere à sua campanha para reeleição.

Também considera séria a situação do Brasil, com um presidente eleito através de uma campanha inteligente, fantástica, mas que se mostra totalmente despreparado, nunca viu procedimentos tão distorcidos como os do Presidente Jair Bolsonaro: “Acredito que ele não termine o governo, não tem condições!”, comenta Sr. Vicente, sempre militante e conhecedor profundo da política.

Também fala das preocupações com a economia de Monte Carmelo, que sofreu grande impacto com o fechamento das cerâmicas, a falta de empregos, o comércio deficiente, a agropecuária como uma forma de nos salvar economicamente, há expectativas de recuperação, mas “não se deve mascarar os fatos, a situação é séria!”

Em Monte Carmelo, Professor Vicente sempre trouxe contribuições importantes, não apenas em suas aulas que prepararam e formaram muitos alunos, mas participou da política, foi um dos fundadores da Hermes Contabilidade e também um dos fundadores da Fucamp , hoje Unifucamp, e membro do conselho deliberativo dessa instituição. Revela as idas a Uberaba para conversarem com Mário Palmério e com Marcelo Palmério, até a grande conquista final. Para ele, a Fucamp tem um valor enorme para nossa cidade.

Foi um dos pioneiros no trabalho com computadores, em 1968. Lembra que o aparelho era enorme. E que trouxe também o primeiro monitor colorido para Monte Carmelo, e ainda tornou-se um comerciante de computadores e internet. Ele é um grande admirador desse aparelho fantástico e do mundo digital. Na década de 80, com 60 anos, ele, que já era mestre em Economia, buscou cursos e aprimoramento em informática, cursou Análise de Sistemas e Processamento de Dados pela Puc-RJ. Há trinta anos, quando o computador ainda era pouco acessível e bem menos potente, ele comprou um micro XP, com discos rígidos de 8 polegadas. Ele dominava como poucos o Excel e ali fazia esplêndidos cálculos matemáticos, desde regressão linear a processamento múltiplo, conseguiram montar sistemas para calcular o PIB trimestral com exatidão fascinante. Na época, ele juntamente com Paulo Guedes e mais um colega economista eram os responsáveis pela análise, redação e publicação dos dados de 500 empresas na revista Conjuntura Econômica da FGV.

De todas as profissões em que trabalhou ( ajudante de caminhão para abastecimento de lenha para combustível na linha férrea, açougueiro, alfaiate, economista, entre outras) , ele revela sua grande paixão: lecionar. Ministrou aulas de Matemática, Direito, Teoria Econômica e Contabilidade. Orgulha-se da carreira de professor e gosta de ser chamado de Professor Vicente. Lembra com admiração das escolas onde trabalhou, dos alunos com os quais sempre teve um excelente relacionamento e dos colegas, destacando, entre vários, o Professor Vicente Lopes Perez, excelente professor de português que atuou em vários estabelecimentos de ensino de Monte Carmelo.

Fala com admiração das escolas da cidade, saudades do extinto Colégio JK, da necessidade de se investir em melhorias no ensino, e ainda cita o Campus UFU como uma grande conquista para a população de Monte Carmelo e região, enaltece a participação importante do político Gilmar Machado em trazer esse campus para nossa cidade, independentemente de convicções partidárias e avaliações feitas sobre sua atuação política.

A última atividade profissional do Professor Vicente foi como perito da Comarca de Monte Carmelo, teve que se afastar por problemas de visão, mas se não fosse isso, estaria trabalhando até hoje, com muito gosto.

Amante também do futebol, o Professor se orgulha de ser torcedor do Vasco da Gama e faz menção aos tempos em que o time carioca era uma grande potência. Quando jovem, jogou em times de Monte Carmelo, como o Fluminense do Alto do Lobo (era esse o apelido do Bairro Boa Vista) e o time do Operário, do qual foi também torcedor. Recorda-se de grandes jogadores que passaram pelo time local, como Jamil, um jogador fantástico, como poucos, segundo ele.

O Professor Vicente Resende chega à idade respeitabilíssima de 84 anos, feliz, realizado, com a sensação do dever cumprido, grato a todos que compartilham de sua história. Não se cansa de reverenciar a família como a estrutura da vida, fundamental, imprescindível.

Embora revele que fora coroinha do Padre César na infância, ele afirma não crer em nada, absolutamente. Como seus pais, ele também cuidava dos doentes da Sociedade São Vicente, aprendeu com Dr.Vivaldo Barbosa a aplicar injeções e gostava muito desse trabalho social.

Revela-se sem mágoas ou ressentimentos, sem inimigos, sem arrependimentos. Se pudesse reviver alguma época, gostaria de reviver a adolescência, porque é a fase de muito vigor, de disposição para tudo. Mas o envelhecer traz segurança e consolidação das experiências.

Professor Vicente Rezende, a esposa Oneida Pereira Rezende, e os filhos Romualdo Rezende, Vicente Rezende Filho

Aos mais jovens, ele aconselha a buscarem as qualificações de acordo com as evoluções tecnológicas, comenta sobre a necessidade de redirecionar a educação para as tecnologias, a inteligência artificial está no domínio de todas as atividades, e as redes sociais são uma revolução extraordinária, “você tem o mundo nas mãos, todo o conhecimento e informações que se quer, você tem em abundância”, explica.

É assim que este grande carmelitano apresentou um pouco de sua história, tão rica de fatos memoráveis, abastada de conhecimento intelectual, de valores familiares, de profissionalismo exemplar, de cidadania responsável, de tantos adjetivos e predicados… este gênio vivo: Professor Vicente Resende!

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